Ira dominical

O carro mal botou a ponta do pára-choque na ciclovia, e ele já explodiu num acesso de fúria.

_ Que isso!? Tá maluco!!? Babaca!

O motorista ficou atônito e com a marca das duas solas daquele ciclista irado impressas no peito.

E o nervosinho continuou, enquanto seguia seu caminho:

_ Não tá vendo a ciclovia!? Porra! Só dando porrada num cara desses...

A manhã de domingo estava linda. Céu azul, sol, crianças por todos os lados, casais, gente correndo, caminhando para a praia. Mas o homem na bicicleta parecia a ponto de explodir a cada instante. A mulher que o acompanhava em outra bicicleta, logo atrás, tinha a fisionomia fechada, tensa.

_ Calma, estamos passeando, você está muito nervoso _ arriscou ela, baixinho, quando as bicicletas ficaram próximas.

_ Eu não estou nervoso!. Eu sou nervoso!! _ respondeu o homem grisalho, sublinhando os dois verbos com uma ênfase que tornava qualquer contra-argumentação um risco.

E, como a mulher se calou após sua resposta, certamente já esperada, ele emendou com um novo comando.

_ Vamos por ali que tem menos carros.

Fiquei pensando no que levaria aquela mulher a conviver com um homem que não fica nervoso, pois, afinal, ele é permanentemente nervoso (e autoritário). O que será que a leva a perder uma manhã mágica de domingo como aquela seguindo um tipo daqueles?

Vai saber...

Se esse cara é assim domingo, imagine na segunda-feira.

Para muita gente ainda vale aquela máxima: antes mal acompanhada do que só.

Só que o tempo que perdemos não volta jamais.

Comentários

  1. Pois é,Marcelo,infelizmente,como são vistos com bons olhos pela mídia,tem muito ciclista por aí que acha que só tem direitos,não deveres e que a lei de trânsito é para os outros. Outro dia,estava no ônibus e o motorista teve de dar uma daquelas freadas "ajeita passageiro" pra não passar por cima de um ciclista que cruzou a via debaixo do nariz dele. O motorista reclamou e recebeu de volta um "educado" dedo médio levantado.
    Quando ao caso que você mencionou,explica em grande parte o porquê de os cemitérios e as cadeias serem os lugares mais lotados hoje em dia. Vejo frequentemente pessoas se orgulhando de serem "esquentadas","pavio curto",e que levam a vida intimidando os outros,procurando confusão,como o sujeito que você mencionou,até que encontram alguém com o pavio mais curto do que o dele,ou que nem pavio tenha. Tá feito o estrago...
    Como diz meu velho pai,Viver,todo mundo vive,saber viver é que são elas...

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  2. Meu pai sempre dizia que todo valentão, um dia, se dá mal, porque acaba encontrando um valentão maior...

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  3. Mauro Pires de Amorim.
    É isso aí Marcelo, me identifiquei com a parte final de seu texto, pois tenho a seguinte filosofia: antes só, do que mal acompanhado.
    Quanto ao tempo, contra esse não adianta se rebelar, pois o máximo que vai conseguir é controlar parcialmente seu próprio tempo, mas nunca absolutamente e principalmente, o tempo dos outros, então o melhor é ter consiência do tempo, porque no fundo, nada será como antes.
    Felicidades e boas energias.

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  4. A mulher ameaçou atravessar, quando percebeu que um carro se aproximava e logo recuou.

    O motorista, insatisfeito com o reflexo e a percepção da pedestre, parou o carro na frente dela e aos berros, disse:

    - não tá vendo o sinal aberto, sua vagabunda?

    A mulher – baixa estatura e corpulenta - ficou paralisada. Demorou alguns minutos até se recompor do susto e realizar a travessia da via.

    Era 7:40 da manhã, feriado nacional, trânsito tranquilo, mas o furioso do volante precisava descontar sua ira matinal.

    Se encontrasse o ciclista da crônica, talvez o desfecho fosse ainda mais violento, pintando de vermelho o recente recapeamento asfáltico.

    Há muitos desequilibrados portadores de CNH.

    Existem estudos que indicam que entre os fatores que contribuem para ocorrência de acidentes de trânsito, estão as características de personalidade do motorista. Um perfil psicológico agressivo, impulsivo, baixa tolerância, pode ser indicativo de maior propensão ao envolvimento em delitos de trânsito.

    Outro estudo importante é sobre o transtorno explosivo intermitente, que de acordo com a pesquisadora Liliana Sege, do HC de SP, atinge principalmente os homens. São os chamados “esquentadinhos”, “pavio curto”. Indivíduos portadores deste mal perdem o controle em situações banais, apresentando uma reação desproporcional ao efeito causador, que para maioria das pessoas causaria uma irritação passageira, irrelevante, superada rapidamente.

    Aparentemente nossos protagonistas sofrem deste mal.

    Tomara que esses homens doentes encontrem a cura. E se não for por obra da ciência, que seja pela graça da Padroeira e do Redentor.

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  5. Mauro Pires de Amorim.
    Não sei se foi minha percepção que aumentou com a idade ou se estou mais atento aos desequilidrados emocionais, mas o fato é tem me chamado mais atenção nos últimos tempos o número de pessoas irrazoáveis que surtam em explosões de descontrole emocial diante de acontecimentos banais e comuns. E para piorar, ainda tem aquelas pessoas que defendem ferrenhamente a posse e o porte de armas de fogo, pois se já há desequilibrados emocionais com CNH cometendo barbaridades com seus automóveis, imaginem com armas de fogo. Se um automóvel já pode ser transformado em arma e protagonizar ocorrências lamentáveis e isso, sem que para conduzi-lo seja exigido exame psicotécnico e avaliação psicológica, quem dirá armas de fogo, onde a avaliação tem que ser muito mais rígida do que para se obter a CNH, pois armas de fogo são feitas para matar ou ferir. No entanto entanto os adoradores e defensores das armas de fogo, não pensam nisso, querem no fundo é se exibirem como "terríveis" por andarem armados ou serem possuídores de uma. A verdade brasileira é que não temos realidade socio-administrativa para liberamos armas de fogo e mal temos a mesma realidade para conduzirmos automóveis ou vivermos em sociedade. Armas pra quê? As pessoas já andam armadas demais e cada vez mais procupam-se e consideram somente a sí, sem levar em conta os outros, que são elencados como ninguém, um nada, uma coisa insignificante. Retrato de uma sociedade cada vez mais consumista, fútil, sem embasamentos sociais sólidos, exibcionista, individualista, com busta insaciável e egocêntrica dos próprios desejos e satisfações. E ainda tem gente que chama isso de progresso, evolução.
    Felicidades e boas energias.

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  6. Infelizmente, como bem disse o magistral Lúcio Cardoso, no idem e imperdível livro CRônica da Casa Assassinada, muitas pessoas possuem tendência para o caos e para a desordem.Há, também, os masoquistas. Existem , ainda, pessoas excessivamente tolerantes, benevolentes, pacientes, portadoras da doce ilusão de que podem ajudar ou melhorar os destrambelhamentos psíquicos dos seus amantes, que, naturalmente, aparecem com mais agressividade, depois de um tempo...Os amores neuróticos constituem o espaço ideal para o "ser humano" praticar o que possui de pior em si, emocionalmente.Há casos de desequilibrados ou melindrados que ameaçam _até de morte_ suas companheiras, se elas os denunciarem.Mulheres existem, também, que, por vergonha da família e amigos, preferem fingir que as coisas podem melhorar num futuro (que jamais chega). É triste, mas é real.Onde não existe respeito, alegria e admiração , com toda certeza, também não existe amor e, sim, exclusivamente,amores neuróticos (lamentavelmente a quantidad e, obviamente, infelizes para sempre!!!
    Abraço do Marcos Lúcio

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