O homem que fumava
Não me lembro se foi no incêndio do Joelma ou do Andraus, tragédias ocorridas em São Paulo e que chocaram o Brasil na década de 70. Eu tinha uns nove ou dez anos de idade e via na TV os prédios ardendo em chamas, as pessoas se atirando lá do alto para a morte ou correndo de uma a outra ponta do terraço na busca de um helicóptero salvador. No Joelma, 199 perderam a vida. Assim como agora, só depois disso é que as autoridades começaram a fiscalizar a existência de escadas de incêndio e extintores nos edifícios.
A imagem que mais me surpreendeu, porém, não foi a das pessoas desesperadas pulando dos prédios mas a de um homem que, em meio ao pânico geral, postou-se numa das pequenas sacadas e lá acendeu um cigarro. Isso mesmo, lamento muito nunca mais ter encontrado uma das fotos publicadas na imprensa daquele que talvez tenha sido o único ali a não se desesperar.
Em pé na varanda, ele levava serenamente seu cigarro a boca, dando tragadas longas e soltando baforadas lentas. A fumaça negra subia, o concreto estava quente, as escadas dos bombeiros só haviam chegado aos andares mais baixos. Nas ruas, erguiam-se cartazes pedindo que as pessoas não pulassem. No alto do prédio, helicópteros pousavam com dificuldade para salvar aqueles que, em vez de descer, subiram para o terraço.
E o homem, que, se não me engano vestia um terno claro, lá, sozinho, fumando.
Fico a imaginar o que passou pela sua cabeça. Daria tudo para saber.
No dia seguinte, meu pai comentou comigo a atitude inusitada daquele homem diferente e garantiu que ele fora salvo.
Os bombeiros conseguiram chegar até ele, disse meu pai, completamente arrebatado pela coragem e pelo sangue frio do homem que fumava na porta do inferno.
Graças ao leitor Bernardo, fico sabendo que a Wikkipédia fala desse homem no verbete sobre o incêndio no Joelma:
"Rolf Victor Heuer - Gaúcho, então com 54 anos, passou mais de três horas sentado em um dos parapeitos do edifício esperando para ser resgatado. Enquanto aguardava fumava vários cigarros, e sua imagem de aparente tranquilidade foi captada pelas câmeras dos noticiários de televisão e amplamente reproduzida. Antes de ser salvo, ainda conseguiu subir ao 19° andar, onde acalmou uma mulher que ameaçava se jogar de uma janela".
Por outras fontes, soube que ele morreu um ano depois do incêndio, de ataque cardíaco. Não deixa de ser um sarcasmo do destino.
Mas, independentemente de qualquer doida, acho que aquela atitude dele no incêndio, misturando calma e resignação diante da possibilidade de morte iminente é um exemplo não só para os casos semelhantes, em que manter a serenidade é a coisa mais difícil.
O que aquele homem fez naquele momento é a atitude que devemos ter na vida.
Nunca se desesperar frente ao destino.
A imagem que mais me surpreendeu, porém, não foi a das pessoas desesperadas pulando dos prédios mas a de um homem que, em meio ao pânico geral, postou-se numa das pequenas sacadas e lá acendeu um cigarro. Isso mesmo, lamento muito nunca mais ter encontrado uma das fotos publicadas na imprensa daquele que talvez tenha sido o único ali a não se desesperar.
Em pé na varanda, ele levava serenamente seu cigarro a boca, dando tragadas longas e soltando baforadas lentas. A fumaça negra subia, o concreto estava quente, as escadas dos bombeiros só haviam chegado aos andares mais baixos. Nas ruas, erguiam-se cartazes pedindo que as pessoas não pulassem. No alto do prédio, helicópteros pousavam com dificuldade para salvar aqueles que, em vez de descer, subiram para o terraço.
E o homem, que, se não me engano vestia um terno claro, lá, sozinho, fumando.
Fico a imaginar o que passou pela sua cabeça. Daria tudo para saber.
No dia seguinte, meu pai comentou comigo a atitude inusitada daquele homem diferente e garantiu que ele fora salvo.
Os bombeiros conseguiram chegar até ele, disse meu pai, completamente arrebatado pela coragem e pelo sangue frio do homem que fumava na porta do inferno.
Graças ao leitor Bernardo, fico sabendo que a Wikkipédia fala desse homem no verbete sobre o incêndio no Joelma:
"Rolf Victor Heuer - Gaúcho, então com 54 anos, passou mais de três horas sentado em um dos parapeitos do edifício esperando para ser resgatado. Enquanto aguardava fumava vários cigarros, e sua imagem de aparente tranquilidade foi captada pelas câmeras dos noticiários de televisão e amplamente reproduzida. Antes de ser salvo, ainda conseguiu subir ao 19° andar, onde acalmou uma mulher que ameaçava se jogar de uma janela".
Por outras fontes, soube que ele morreu um ano depois do incêndio, de ataque cardíaco. Não deixa de ser um sarcasmo do destino.
Mas, independentemente de qualquer doida, acho que aquela atitude dele no incêndio, misturando calma e resignação diante da possibilidade de morte iminente é um exemplo não só para os casos semelhantes, em que manter a serenidade é a coisa mais difícil.
O que aquele homem fez naquele momento é a atitude que devemos ter na vida.
Nunca se desesperar frente ao destino.
Krishnnamurti fala sobre desapego, Tolle fala sobre desapego, Buda e Jesus, idem. Ouso dizer que aquele homem, pelo menos naquele momento, se desapegou, de tudo. Posso te dizer que é um momento de iluminação que todo ser humano deveria ter o direito de experimentar. Mas creio isso ser difícil com a qualidade de vida imposta à maioria, imperando da sobrevivência à hegemonia. Percebo-nos ainda viciados em exercícios de poder. Quando nos for ensinado tanto no berço quanto na escola, a nos desapegarmos, a grande transformação começará. Sem apego a revolta deixará de ser incentivada, o esforço físico e mental serão equivalentes.
ResponderExcluirFUMO
ResponderExcluirPoema de Florbela Espanca
Musicado por Fagner
Longe de ti são ermos os caminhos
Longe de ti não há luar nem rosas
Longe de ti há noites silenciosas
Há dias sem calor, beirais sem ninhos
Meus olhos são dois velhos pobrezinhos
Perdidos pelas noites invernosas
Abertos sonham mãos cariciosas
Tuas mãos doces, plenas de carinhos
Os dias são outonos, choram, choram
Há crisântemos roxos que descoram
Há murmúrios dolentes de segredos
Invoco o nosso sonho, estendo os braços
E é ele, ó meu amor, pelos espaços
Fumo leve que foge entre meus dedos
E é ele, ó meu amor, pelos espaços
Fumo leve que foge entre meus dedos
Ps. Veja o video da musica, vale a pena
Numa dessas o que ele queria mesmo era morrer e os bombeiros acabaram atrapalhando os planos dele.
ResponderExcluirAgora, se fizerem uma pesquisa sobre que atitude cada pessoa tomaria numa situação dessas, acho que uma em um bilhão responderia que teria o mesmo comportamento que esse homem teve.
Bom senso não se explica.
ExcluirSó se demonstra. E foi isso q ele fez....
Torelly
O destino eh uma coisa que so existe depois que acontece.
ResponderExcluirComportamento raro. A iminência da morte, mesmo sendo companheira fiel desde a gestação, amedronta a maioria das pessoas, que preferem viver negando sua presença e quando de sua inevitabilidade inexorável, desesperam-se, paradoxalmente surpreendidos, surpresos e agõnicos.
ResponderExcluirPessoalmente, mantenho com a morte, relação serena. Já em relação a morte de um outro , amado, o golpe atinge-me forte.
ANTONIO CARLOS
Eu devia ter uns quatro, cinco anos...uns dez anos após a tragédia, também foi meu pai que me falou sobre o inusitado calmo fumante. Drum
ResponderExcluir"Nunca se desesperar diante do destino".
ResponderExcluirCaramba, Marcelo! Essa frase caiu como uma luva pra mim. Acho que foi uma mensagem que o próprio Destino enviou a mim, através da sua escrita. Exatamente o que eu estava precisando ler agora.
Quanto ao fato que você relata, muito embora eu não fosse nascido nos anos 70, sei que foi no episódio do Joelma, em 1974. A wikipédia traz a seguinte informação, no verbete "Edifício Joelma":
"Rolf Victor Heuer - Gaúcho, então com 54 anos, passou mais de três horas sentado em um dos parapeitos do edifício esperando para ser resgatado. Enquanto aguardava fumava vários cigarros, e sua imagem de aparente tranquilidade foi captada pelas câmeras dos noticiários de televisão e amplamente reproduzida. Antes de ser salvo, ainda conseguiu subir ao 19° andar, onde acalmou uma mulher que ameaçava se jogar de uma janela".
Estaria ele vivo ainda hoje? Um grande exemplo, sem dúvida! Manter a calma ao invés de se entregar ao pânico é essencial, e pode salvar muitas vidas, inclusive a nossa própria. Em várias situações da vida.
Abraços.
Valeu, Bernardo, coloquei no texto. Não se desesperar não é fácil, mas eu acho que é o que devemos ter em mente. Abraço e boa sorte.
ExcluirMarcelo,
ResponderExcluirMeu nome é Adriana Reus e sou filha do "Homem do Terno Marrom", que estava no incêndio Joelma em 1974.
Tenho algumas correções a fazer, em relação ao texto que foi publicado pela Wikipedia:
O nome correto do meu pai é Rolf Victor Reus. Ele nasceu em 17/06/1925, então na época do incêndio ele tinha 48 anos.
Somos de Porto Alegre e ele trabalhava na Crefisul e havia sido transferido para São Paulo em 1972. Depois do incêndio, minha mãe ficou traumatizada e então resolvemos voltar para Porto Alegre. Meu pai pediu demissão da Crefisul e começou a trabalhar na Sulbrasileiro Crédito Imobiliário. Ele era Auditor.
Realmente, ele era uma pessoa extremamente calma e só por isso se salvou. Ficou fumando enquanto aguardava o socorro, por mais paradoxal que possa parecer.
No sábado passado, dia 01/02/1974, completaram-se 40 anos do incêndio e o jornal da Band fez uma matéria, onde falam do meu pai (http://noticias.band.uol.com.br/jornaldaband/videos/2014/02/01/14847144-incendio-do-joelma-completa-40-anos.html).
Como coloquei no comentário que fiz no site do Jornal da Band, por ironia do destino, meu pai veio a falecer 4 anos depois, de infarto, quando estava fazendo uma viagem a serviço a São Paulo.
Qualquer dúvida, estou à disposição.
Um abraço.
Adriana Reus
Adriana, obrigado pelos esclarecimentos. Fique com Deus
ExcluirEu era bem criança, mas me lembro desse homem e sempre penso nele. Tudo aquilo me deixou tão impressionada. Mesmo naquele lugar, ele se manteve calmo, como se tivesse fumando num lugar tranquilo e ainda ajudou outras pessoas.
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