Tateando no escuro

Assim como alguém já disse dos livros, acontece o mesmo com o cinema: a única coisa que se aprende vendo muitos filmes é que a maioria dos filmes não merece ser vista.

Aproveitando um período de férias há muito negligenciadas por mim mesmo, tenho ido bastante ao cinema. E o que tenho visto de filmes ruins não está no mapa.

O mais recente deles foi Capitão América: o primeiro vingador, duas horas e pouco de tiros, explosões e porrada. História? Quem precisa dela? O argumento é o mesmo de sempre, só muda o super-herói. Um cérebro maligno quer dominar o mundo e coisa e tal... blerg! Com a computação gráfica, tudo é possível. Os produtores e diretores agora apenas buscam pretextos para mandarem metade do planeta pelos ares em 3D. O mote pode ser a terceira guerra, uma invasão de alienígenas, magia medieval, furacões, tsunamis... não importa. O negócio é manter a platéia com cara de ameba e engolindo pipoca e refrigerante vendidos a peso de ouro nos cinemas de shopping centers.

Outra bomba que vi foi Assalto ao Banco Central. Filme brasileiro, portanto o problema aqui é outro: excesso de falas, tudo explícito demais, didático como o programa Silvio Santos, para qualquer jegue entender que aquele é um filme sobre um assalto ao Banco Central. Não há pausas, nem silêncios, nem penumbras nos filmes brasileiros. Aquelas interpretações sempre acima do tom e a iluminação de novela impedem qualquer realismo.

A lista de chatices em cartaz tem também A Vênus Negra, inacreditáveis 2h40 em que um diretor tenta sem sucesso contar a vida de uma jovem africana exibida como animal exótico nos circos e altas rodas da Europa no século retrasado. Quando a personagem principal começa a contar pela terceira vez sua vida na África eu levantei do cinema e fui embora. E ainda faltava uma hora para o fim da penitência.

Também vi Poliche, a esposa troféu, que nem a beleza de Catherine Deneuve e o talento de Gerard Depardieu conseguem salvar. E Corações perdidos, um odioso filmeco daqueles que as emissoras de TV aberta passam sábado à noite. Assim como na semgraceira francesa, nesta produção americana o ótimo James Gandolfini naufraga na apelativa e previsível história do casal que perde uma filha e acaba adotando afetivamente uma prostituta adolescente.

Pensei que a coisa iria melhorar em Meia noite em Paris, que tem a grife Woody Allen, mas ele se repete mais uma vez, agora optando por um ator que encarna seu alter ego neurótico de sempre. A remissão do escritor sonhador a reencontros com personagens famosos do passado é uma boa ideia, mas o filme não chega a empolgar. Um dos meus critérios para avaliar um filme é a primeira vez que olho no relógio após o início da sessão. Nos grandes filmes, esqueço a hora; nos ruins, com 40 minutos de projeção, em média, já estou consultando para ver quanto tempo durará o martírio.

Não tinham se passado nem 15 minutos de A missão do gerente de recursos humanos quando consultei o artefato preso ao meu pulso esquerdo. Num ritmo modorrento, a tarefa de um funcionário israelense de agilizar o sepultamento de uma ex-colega enterrou a minha tarde.  Tudo bem, férias são férias...

Tempo de sobra eu tinha para perder também com Singularidades de uma rapariga loura, média metragem do veteraníssimo cineasta português Manoel de Oliveira, que nos mostra neste seu roteiro sem final que sempre chega a hora da aposentadoria... 

Mas nem tudo é bagaceira. Achei legalzinho Namorados para sempre, que conta a história de um casal em crise cuja separação é entremeada por lembranças dos tempos de namoro. Como é doce aquela época da paixão, quando cada um dá o melhor de si ao outro. O final é triste e desapontou minha filha, que vive o amor adolescente e sonha sempre com um final feliz. Deixar um gosto amargo na boca do espectador, às vezes salva o filme, como neste caso. Os atores Ryan Gosling e Michelle Williams convencem muito, principalmente ele.


Mas bom mesmo é Minhas tardes com Margueritte, deliciosa história francesa com o mesmo grande Depardieu e a linda octogenária  Gisèle Casadesus. Sensibilidade rara nas telas, pausas, silêncios, olhares, um filme para quem acha que emoção não barulho e correria e que amor não é sexo comprado em supermercado.


Ainda com alguns dias de férias para curtir, espero que, antes de voltar ao batente, um filme argentino como O Homem ao lado, que, aliás, ainda está em cartaz, venha me mostrar mais uma vez como se faz cinema.

De Capitão América, prefiro esse velho de guerra

Comentários

  1. Coincidência. Dos vários filmes em cartaz, Namorados pra sempre é um dos poucos que (pelo trailer) me pareceu valer a pena. Mas fujo de filmes sobre infelicidade.(rs)

    Ia enviar um comentário sugerindo Minhas Tardes com Margueritte, que assisti e achei...como direi?...fofo (rs) quando li que já o tinhas visto.

    Aliás, qualquer filme falado em francês tem 50% da minha simpatia, e com Gerard Depardieu, então, as chances aumentam consideravelmente. ;o) Mas Potiche - concordo contigo - é ruim de doer! (como é que alguém consegue fazer um filme ruim com Catherine Deneuve e o Depardieu é um mistério profundo)

    Ia sugerir, também, O Homem ao Lado quando li que é o próximo da tua lista. Como filme argentino dificilmente é ruim eu quase ponho minha mão no fogo por ele, mesmo sem tê-lo assistido.

    Depois ´confirme´ se é bom. (rs)

    ResponderExcluir
  2. Oi, Vilma, escrevi sobre O homem ao lado: http://www.jblog.com.br/rioacima.php?itemid=26949. Um abraço

    ResponderExcluir
  3. hahahahahaha...
    Depois de tantas experiências frustantes no cinema, acho que seria melhor você buscar uma outra opção de lazer.
    Dessa lista, eu só vi o Capitão e o Meia noite em Paris, e gostei dos dois, devo fazer parte da platéia com cara de ameba, só que eu não como no cinema.
    Mas convenhamos, alguns filmes são muito mais tragáveis que os livros, pelo menos para mim, Senhor do Anéis é muito melhor nas telas que nos escritos de Tolkien, Clube da Luta também, e do Rede Social nem se compara, o livro é um porre, o Fincher é o cara para tirar um bom filme de tal livro.

    ResponderExcluir
  4. Marcelo - realmente tá dificil ver filme bom hoje em dia. Antigamente ia muito ao cinema, mas agora ja faz séculos!
    Estou vendo a foto de entrada de seu blog e me lembro que há séculos cheguei a morar um mes e pouco na Lagoa, mas isso é outra história.

    ResponderExcluir
  5. Um mês foi pouco, caro Roland, a foto é da Praia de Botafogo. Abração

    ResponderExcluir
  6. Ah...eu achei que ainda não tinhas visto O Homem ao Lado. Legal! Eu tenho mesmo vontade de assistir a este filme, e depois de ler o que escreveste deu mais vontade ainda. :o)

    ResponderExcluir
  7. MESTRE DOS MARES. Veja um filme que vale a pena.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas