Texto publicado em 2010

Beneficiado por liberdade condicional, o goleiro Bruno Souza deixou ontem a prisão onde cumpriu parte da pena pela co-autoria do assassinato de sua ex-amante Eliza Samudio, desaparecida em 8 de junho de 2010. O jogador teve direito à soltura por ter cumprido um terço da pena com bom comportamento.

Agora, Bruno quer voltar a jogar.


Não tenha dúvidas, você ainda vai ler esta notícia.

Afinal, estamos no Brasil, onde a vida humana vale muito pouco, e a de uma mulher, menos ainda. Não temos tradição de punir exemplarmente assassinos de esposas, amantes, namoradas ou simples desconhecidas.

Talvez haja mais homens presos por não pagarem pensão alimentícia do que por assassinar uma mulher.

Se não for um maníaco do parque, um típico serial killer, o matador costuma deixar a cadeia após seis ou sete anos, como aconteceu com o ex-ator condenado pela morte de Daniela Perez. Se tiver dinheiro para pagar advogados influentes, que conhecem as idiossincrasias dos tribunais e sabem explorar os meandros da Justiça, não cumprirá nem a metade da pena.

Foi o caso do jornalista Pimenta Neves. Em 20 de agosto de 2000, ele matou sua colega de profissão e ex-namorada Sandra Gomide com dois tiros à queima-roupa, diante de uma testemunha. Condenado a 19 anos de prisão, levantou-se do banco dos réus ao fim do julgamento e foi para casa, amparado pela Justiça.

No despacho que anulou o veredicto, a sub-procuradora da República entendeu que a defesa de Pimenta foi cerceada. E Sandra, teve defesa ao ser emboscada por seu algoz? Toda essa onda da imprensa em torno da morte de Eliza Samudio faz parte do show. Orgias, bebê abandonado, ossos dados aos cachorros, cervejinha para comemorar a execução… não se engane. A indignação popular é passageira.

Se Bruno for mesmo considerado culpado pela Justiça, no dia em que ganhar a liberdade não vai fazer diferença se o ídolo do Flamengo mandou ou não dar a carne da mãe de seu filho a um rottweiler. Ninguém na opinião pública vai protestar.

Nossos deputados e senadores não sofrerão qualquer pressão para mudar um Código Penal que, para quem tem dinheiro, abre mais brechas que a defesa da seleção de Honduras.

Amanhã, ou depois, Bruno não será mais manchete de jornal. Ficará esquecido por um tempo até voltar a ser notícia, quando ganhar a liberdade.

Primeiro, provisória; depois, definitiva. Como Pimenta, talvez diga que agiu “sob forte emoção”.

Eliza, a única pessoa que certamente se indignaria, não está mais aqui. Outro crime hediondo ocupará o alto das páginas e os noticiários da TV. Um novo criminoso será pregado na cruz da mídia. E, quatro ou cinco anos depois, estará solto também. 

Jornal do Brasil 
Domingo, 11 de Julho de 2010

Comentários

  1. Muitos alegam que Bruno foi condenado sem provas e está (estava) preso injustamente,
    Já o dr. Hosmany Ramos, rico e influente, que tentou varias fugas da prisão, agora vive na Noruega, deveria morrer lá dentro, pois tirou a vida de um ser humano.
    Cury

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  2. A "justica" brasileira pode ser comparada a rede de esgoto de uma grande cidade: A cada metro novos canos se interligam formando um emaranhado de merda fedorenta por onde ratos passeiam...
    Mais triste do que ver esse individuo livre eh ver a pequenez do nosso judiciario.

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  3. O texto tem um erro crasso que cabe mencionar: Ele não é e nunca foi idolo do Flamengo. Era parte de um elenco e que chegou a ser admirado, mas que deixou de sê-lo ao se envolver no crime. Ídolo é Edmundo que hoje vive dando conselhos na televisao e todo mundo ja esqueceu das 3 mortes que ele causou.

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  4. Muito bom este texto . O povo brasileiro tem indignação seletiva e raramente se solidariza com mulheres vitimadas.

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