Justa homenagem a um tricolor

Não vou falar muito sobre o excelente jornalista que foi Paulo Julio Clement. Para os que não conheceram seu trabalho, basta dizer que ele se destacou no rádio, no jornal impresso e na televisão, ou seja, dominava o texto escrito, a linguagem radiofônica e a performance televisiva. Especializado em esportes, foi também editor-executivo do Jornal do Brasil, época em que pôde demonstrar que sua cultura e seu faro jornalístico iam muito além do futebol.

Prefiro falar aqui do amigo que encontrei nele desde a primeira vez em que nos vimos numa redação, a de O Globo, no ano de 1995. PJ era então repórter da editoria de esportes e recebeu bem o novo editor da Revista da Tevê que chegava vindo da Folha de S. Paulo. Ao contrário de outros profissionais mais antigos ali, que torceram o nariz para o novato que chegava já com cargo de chefia, Paulo Julio sempre foi amistoso e receptivo. Seu olhar desarmado tinha o poder de deixar qualquer um à vontade.

O que, aliás, merece um parágrafo é o fato de eu nunca, jamais, ter visto qualquer ato preconceituoso do Paulo Julio contra quem quer que fosse. Tratava a todos como iguais, e essa foi a característica dele que mais me impressionou. Não discriminava nem mesmo os colegas jornalistas que, na época do golpe em Dilma Rousseff, ficaram em cima do muro com medo de perderem seus empregos. Ao contrário deles, PJ sempre se posicionou favoravelmente à democracia e ao estado de direito.

Logo surgiu entre nós a identificação imediata por torcermos pelo mesmo time, o Fluminense, que agora lhe presta uma justa e merecida homenagem, batizando com seu nome a nova sala de imprensa do clube. Passávamos longo tempo relembrando os jogos do tricolor que acompanhamos na adolescência, do mesmo lado da arquibancada mas ainda sem nos conhecermos. Ele era o único torcedor que ainda guardava na memória aqueles jogadores obscuros cujos nomes se perderam no tempo. Bem, ele não era o único, porque eu também lembrava daqueles caras e de jogos e até de lances de 30, 40 anos atrás. É impressionante como o futebol tem a capacidade de eternizar décimos de segundo em nossa memória para sempre. O prazer que tínhamos em ficar desenterrando essas memórias era indescritível. Tanto que até hoje sinto falta e sempre que lembro do meu amigo lamento aquele acidente aéreo horrível que vitimou o time da Chapecoense e muitos jornalistas que acompanhariam a partida do clube na Colômbia.

Paulo Julio Clement foi uns dos melhores caracteres que conheci nos meus mais de 30 anos perambulando por redações. Pouco antes de sua morte, cerca de um mês se tanto, nos encontramos no batizado do filho de um amigo comum, o também jornalista André Balocco. Chovia, e topei com o PJ perto da igreja. Ele tinha deixado a esposa Flávia e o filho Theo e saído para encontrar uma vaga de estacionamento. Parei o carro perto do dele e o abriguei da chuva na caminhada dali até o local do batizado, onde ele apadrinhou o pequeno Pedro. Depois da cerimônia, ainda com a camisa molhada da chuva, Paulo me perguntou baixinho:

_ Acha que eu vou ser um bom padrinho.


_ O melhor _ respondi.

* Texto escrito para o site Conexão Jornalismo


Comentários

  1. Não o conheci, mas se você falou que é gente boa, deve ter sido mesmo !!

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  2. Simone Magalhães de Souza Moreira13 de setembro de 2020 às 02:27

    Uma pessoa inesquecível.

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